Radicado em São Paulo, Brasil, o artista urbano ECT interveio no espaço público de Buenos Aires como forma de continuidade e convite a entrar em ArtHaus -o novíssimo espaço cultural multidisciplinar localizado no que foi um banco- com um lagarto de 120 metros pintado na rua que “representa o desejo de que apesar de tantas vidas perdidas e de tanto sofrimento, possamos nos regenerar enquanto sociedade”, como afirmou.
Embora a pandemia de Covid-19 declarada em março de 2020 persista e esteja perto de sete milhões de mortes em todo o mundo, segundo dados da OMS, o encerramento das atividades presenciais que silenciaram cidades como Buenos Aires promoveu a refuncionalização da cidade com vários projetos, como culturais.
É o caso da ArtHaus, que vem inaugurando com diferentes atividades, desde o ano passado, seu novíssimo prédio localizado na Bartolomé Mitre 434, um projeto cultural multidisciplinar, inscrito no universo das indústrias criativas, do empresário e do músico. Andrés Buhar.
Nessa busca por renovar e gerar “outros formatos artísticos”, o local que foi sede de um banco responde a uma nova forma de viver que muda “o uso do microcentro pela arte”, segundo Buhar.
“Na Arthaus estamos sempre pensando em como atender o público. É por isso que somos um espaço onde não só haverá artes plásticas, teatro, cinema e música, mas também um restaurante e um bar na esplanada, refere o fundador do espaço, explicando que este objetivo “está no seu ADN por propondo uma nova articulação entre arte, lazer e vida”.
O que simboliza esta obra no âmbito do projeto cultural? “Esse lagarto enorme quer conhecer o público e por isso ficamos empolgados em modificar o ambiente, saindo para a rua. Pedimos ao TEC para assumir o projeto porque ele é o primeiro artista urbano a começar a pintar no asfalto e foi ele quem nos pediu para pintar um lagarto”, explica.
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“Achamos que esta imagem resume de maneira muito lúdica a ideia da ressurreição do centro da cidade e, ao mesmo tempo, alertou sobre a mudança climática, e em Buenos Aires as altas temperaturas dos últimos tempos causaram uma invasão desses répteis ”, esclarece e acrescenta: “acreditamos que a arte é um poderoso agente transformador”.
“Existem muitos exemplos no mundo de como a arte pode modificar o espaço urbano: Soho em Nova York, Shoreditch em Londres, Wynwood em Miami, o bairro Brutus em Roterdã”, lembra Buhar, que está animado porque “a mesma coisa acontece no microcentro de Buenos Aires”.
O artista -cujo nome representa “uma onomatopéia, um som seco na selva de concreto”- considera a rua, a cidade sua fonte de inspiração e aí explora essa ambigüidade entre o público e o privado da arte por meio de intervenções performáticas, instalações de um sítio específico e o registo de uma ação que o levam a aventurar-se na mistura de linguagens visuais, embora também pinte telas.
Que experiências o trabalho com arte urbana te proporciona e o que acontece quando você começa a trabalhar em telas ou instalações? “Entendo a arte como uma parceria entre quem a produz, quem a recebe e o contexto, em que cada plataforma tem suas características. A rua, sem dúvida, é a minha preferida pela instantaneidade e porque, de alguma forma, conduz o espectador à arte de uma forma surpreendente”.
O artista explica que nas instalações gosta de apresentar suas ideias “sobre história, política e sobre conflitos sociais que me despertam e me sensibilizam. E nas telas eu uso várias camadas, várias mensagens, para que você veja o trabalho uma ou mil vezes, e encontre sempre algo novo”.
TEC começou a carreira de artista na adolescência “com grafite em aerossol, primeiro promovendo uma banda de rock e depois, influenciado por um livro de trens pintados em Nova York, comecei a pintar letras e alguns personagens”. Em relação às suas influências, destaca-se a figura de artistas como Joan Miró e basquiat nas artes plásticas”, e “pelo seu carácter independente, Patricio Rey e os seus Redonditos de Ricota na esfera musical”.
Com obras no Brasil e Argentina, entre outros países, sua obra urbana se instala em muros, asfalto e outras superfícies que trazem sua assinatura em formas estilizadas, daquelas que parecem alçar voo como as conhecidas pipas com suas sombras dispostas em perspectiva .pintados no chão, até pequenos animais -peixes, sapos, cobras- em um estilo mais infantil, colorido e de linhas aparentemente simples.
Mas não são só estas linhas que fundamentam a sua obra, há também os livros que incorpora desde 2016, porque “são transformadores, mantêm viva a nossa memória e dão asas à nossa imaginação”. Esses trabalhos o levaram a usá-los em instalações e murais específicos do local. cuide da cabeça em comemoração a Cordobazo, em sua cidade natal.
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Em 2022 recebeu o Konex de Arte no Espaço Público, e entre suas obras mais conhecidas está o grande mural da “cegueira” (2015) no Minhocão, São Paulo, e também teve sua exposição Urban-Tec no MAB-Faap museu da cidade de São Paulo.
Além disso, participou em 2001, do coletivo Fase na UBA, “por ter interesses comuns e por entender o espaço público como lugar de ação e reação, um lugar interessante de experimentação gráfica e comunicativa”.
—Por que você usa a rua para realizar seu trabalho?
— É uma fonte infinita de inspiração, o público na rua é mais sincero, valorizo muito aquela espontaneidade do passante que me vê trabalhando e começa a conversar comigo. Deixo meu trabalho na rua para que possam usufruir gratuitamente, e ao mesmo tempo levo comigo muitas informações para continuar produzindo. Com a rua formei uma sociedade muito igualitária, que nunca deixa de me emocionar e surpreender.
— Como essa forte identificação com o universo poético das crianças se dá em sua obra?
— A minha incapacidade de desenhar figurativamente levou-me a procurar alternativas para me dedicar à arte e, a partir desse problema, aproximei-me muito do desenho infantil, da sua síntese, da sua frescura e da sua liberdade expressiva.
— Como é sua experiência de educação em arte para crianças?
— Desde que pintei na rua, o interesse das crianças sempre me chamou a atenção, e a partir disso criei um projeto educacional para fortalecer a autoestima por meio da arte, usando o muralismo como ferramenta. Trabalho há mais de 10 anos com as escolas públicas de São Paulo, dando aulas onde as crianças desenham livremente e depois transformo esses desenhos, multiplicando sua escala, em grandes murais nas fachadas das escolas.
Em vez de lhes dizer que desenham mal, não só lhes digo que é muito bom, como, caso não acreditem, transformo esses desenhos em murais gigantes, valorizando o seu trabalho e criando uma apropriação do espaço público em o contexto das escolas.
— Na sua experiência de morar no Brasil, existe um antes e um depois de Bolsonaro para criar?
— Sim, a tragédia humanitária e a liberação das armas de fogo nos colocaram todos em estado de resistência, seja na arte ou em qualquer disciplina. Foi um momento muito difícil onde fui obrigado a reagir e fortalecer o sentido da arte como meio de protesto.
— Como é sua experiência atual com esse lagarto de 120 metros de cores, de onde ele vem?
— Surge do facto da regeneração corporal destes répteis, fazendo uma analogia com a necessária regeneração pós-pandemia. Para mim representa otimismo, um desejo de que apesar de tantas vidas perdidas e de tanto sofrimento, possamos nos regenerar como sociedade.
— Não teria sido viável tirar a imagem de uma pipa ou pipa como o trabalho “Cosmic Kite” que você fez na Calle Libre em Viena em 2022?
— As pipas são uma característica dos bairros suburbanos das cidades do Brasil, para mim faz muito sentido pintá-las lá, tendo pintado na Áustria tinha a intenção de levar um pedaço da cultura brasileira para o primeiro mundo, é foi uma piscadela cúmplice para meus amigos.
— Quais são seus próximos projetos?
— Tenho muitas escolas para pintar este ano no Brasil e um convite para pintar um mural em minha cidade natal, Córdoba, por ocasião dos seus 450 anos.
Fonte: Télam SE See More
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